quarta-feira, 11 de janeiro de 2017

Disputa de consciência e a batalha de hegemonia pela nova Direita Pós-Moderna

Ensaios sobre a Pós-Modernidade de Direita nº 19

por Almir Cezar Filho

A presente série de artigos, escritos sob a forma de ensaios começou no final de 2015. Quando comecei a série o objetivo era investigar e comentar a respeito da percepção de que estava ocorrendo uma popularização de uma nova consciência de Direita, especialmente na classe média mais escolarizada, ao longo de 2014 e 2015. Digo uma nova "consciência", pois a forma que se manifestava era nova e combinada a uma pauta com vários itens que era anteriormente com uma aparição muito limitada ou secundária. 

Portanto, a própria hierarquia entre os itens da pauta e mesmo sua apresentação diferia ao convencional da Direita brasileira. Não quer dizer que não havia se manifestado antes. Justamente, isso que eu apontava nos ensaios: antes tímida, agora esta estava mais organizada e disseminada; e concorrendo e mesmo vencendo o que era a Direita convencional até então.

Apontava também os ensaios, que apesar de semelhanças, essa nova Direita não era a mesma dominante antes no país. E apesar de uma vertente se intitular liberal, não compartilhava o suficiente para se enquadrar na velha tradição do Liberalismo clássico ou neoclássico, mesmo aquele do Brasil. Igualmente acontecia com o que se proclamavam conservadores. Com características potencialmente similares ao que acontecia com a Esquerda, essa nova Direita pode-se ser enquadrada como Pós-Moderna.

Desde o início da série de ensaios tomou-se a opção um tanto ousada de não revisitar os principais intelectuais que tratam criticamente o fenômeno Pós-Moderno, especialmente o sociólogo Zygmut Bauman, membros da Escola de Frankfurt (as leituras básicas foram textos de Max Horkheimer Theodor Adorno e Jürgen Habermas), ou mesmo os brasileiros, como Mário Sérgio Cortella, Leandro Karnal. Até as polêmicas teóricas interna à Esquerda partidária, especialmente a marxista. Assim, sem revisitar explicitamente a produção teórica, tomou-se nos ensaios como dado tudo a respeito e procurou então aplicar esse cabedal à análise da nova Direita brasileira. 

Por sua vez, as investigações manifestadas nos textos expressão ainda outro aspecto: procurou-se revisitar o cânon da Direita, tanto o Liberalismo, como mesmo o Conservadorismo. Apontando assim sua matriz diferente à Direita clássica e neoclássica - convencional à Modernidade. Também procurou investigar suas principais manifestações e vertentes, classificando-lhes, como também seus expoentes e lideranças, embora, ao contrário, sem dar-lhes destaque individual nos textos.

Temos assim a descrição de uma Direita mais "reavivada", que rejeita velhas posições e práticas da Direita convencional, e disputa sua base política. Tímida no Brasil até recentemente, diferentemente na Europa e América do Norte, fez-se mais organizada mais recente e exige e impõe uma pauta,  uma agenda, embora oferece uma concertação, um bloco de hegemonia sobre a sociedade. Porém, sobre à Direita o mesmo impacto que a condição Pós-Moderna se passa na Esquerda (apesar dessa Direita negar isso), cujo fenômeno se manifesta a mais tempo.

Embora, atribuída pela Direita à Esquerda, o fenômeno  Pós-Moderno ou condição Pós-Moderna foi primeiramente denunciado por ela. Expressando assim, inclusive, não apenas como divulgadora apologista desse fenômeno, ou mesmo crítica a ele, mas como vítima dessa condição. E que mesmo assim, ainda não sabe lidar com esse fenômeno, tanto ideológico, como objetivo. O que se expressa agora no Brasil.

A Esquerda brasileira convencional, tanto a revolucionária, como a reformista, inclusive por estar em presa em velhos debates internistas. era apenas habitual a lidar com suas próprias vertentes Pós-Moderna. E apesar de se manifestar na Europa e América do Norte a mais tempo, ao se deparar com essa nova Direita aqui tomou um susto.

A emergência dessa nova Direita e em ampla ofensiva - combinada a derrocada da presidenta Dilma Rousseff e do PT à frente de um governo com traços sociais-democratas - passavam, portanto, a impressão de uma "onda conservadora" ou "de direita". O impeachment potencializou, à medida que a Esquerda e a Centro-Esquerda não preparadas, viram seu discurso ideológico, mesmo o oportunista, ser questionado publicamente, passando a colocar-se como vítima dessa "onda" contrária.

Porém a raiz em muito antecede isso. A Esquerda das últimas quatro décadas, marcada por um profundo questionamento à Socialdemocracia e ao regime socialista de tipo soviético (stalinista) e posterior ruptura, aderira, por um lado, parcialmente ao Neoliberalismo e a concepção de que a democracia parlamentar-eleitoral burguesa e a economia de livre-mercado era um tipo universal e a-histórico de formação social.

E por outro lado, a uma busca frenética pelo "novo" e um desprezo crônico por todas as formas como as essências da sociedade moderna e industrial. Presa no identidarismo e nas minorias. Em suma, a atual Esquerda pouco dialoga com as massas operárias e populares, especialmente as emergentes,  aos novos segmentos dessa massa, alheias a democracia parlamentar e sufocadas pela implementação das medidas neoliberais.

Dessa maneira, essa simultânea adaptação capitulacionista ao Capitalismo e à Democracia burguesa não preparou a Esquerda para os vários momentos de ruptura e de intensificação da luta de classe (como a crise econômica mundial iniciada em 2008), em que a burguesia resolve tomar para si em rédeas curtas o funcionamento do sistema. E/ou as massas operárias e populares resolvem se desligar de sua liderança política que não atendem suas necessidades. Essa procura de liderança, lança as massas operárias e populares no colo da direita.

Temos uma direita tão pouco erudita e refinada. Em suma, tosca. Não por ser minoritária, ou mesma refratária à Academia. Mas por ser Direita, logo vinculada convencionalmente à Tradição. Como o Brasil a população é ignorante, suas tradições são, portanto, por si mesmas pouco refinadas.

Se as ciências sociais ensinam coisas que vão de encontro ao que o senso comum diz (construído pela mídia, igreja, família, etc, instituições do sistema Capitalista e da dominação da burguesia) e isso incomoda, o que se deve fazer é suspender o ensinado pelas ciências sociais. Acusa-a de doutrinação ideológica. Repele-se assim o Marxismo, o pensamento liberal sobre Direitos Humanos e sobre o Estado, o Keynesianismo, o princípio do Estado de Bem-Estar Social, etc. E depois o mesmo se faz com as ciências naturais, vide a teoria da evolução contraposto pelo Criacionismo e Hipótese do Design Inteligente; o heliocentrismo, contraposto pelo geocentrismo e pela hipótese da Terra Plana; e a teoria da gravidade.

Para a nova direita, seria como se os professores ao desenvolverem propostas pedagógicas a desenvolver a capacidade de reflexão crítica dos seus estudantes, estivessem fazendo doutrinação, ou pior, recrutamento ideológico. O conhecimento científico não é mais confrontado cientificamente, ou por fatos, mas por opiniões e se forem majoritárias por que há conspirações, se são minoritárias, são ideologias a serem suprimidas.

Portanto, a batalha não é da Esquerda contra a Direita reavivada, ou bloco dessa com a velha Direita, mas a velha luta de classes com a burguesia. Não é mais possível alianças com a centro-direita ou uma direita mais esclarecida ou com a mais frágil. É necessário resgatar a posição de Esquerda, isto é, vinculada exclusivamente às classes subalternas e empenhada na transformação social radical.

Nenhum comentário:

Postar um comentário